12.3.11

Doente do pé

Celso de Almeida Jr.


Publicado no jornal A Cidade - Coluna Política & Políticos
Ubatuba-SP, 19 de fevereiro de 2000


Quem lembra disso?:
"Nesta avenida colorida, a Brasília faz seu carnaval..."
E disso?:
"Mas em cima da hora, o coração bateu mais forte que a razão..."
Essa vai para o Dr. Romeu e o Moacir:
"Tradições afro-brasileiras, os Acadêmicos de Ubatuba vêm apresentar..."
Outro dia fiquei comovido cantarolando esses trechinhos de enredos de escolas de samba.
Brasília, vermelho e branco; Acadêmicos de Ubatuba, verde e rosa, foram escolas que toquei na bateria, no repique, sob comando do mestre Cuca.
Disputávamos com a fortíssima rival, o Itaguá, que brilhava com o azul e branco de seus componentes apaixonados.
É difícil entender Ubatuba.
Como é possível estas escolas não mais desfilarem se estão em nossos corações?
Será que o problema é dinheiro?
Lembro-me da pobreza franciscana que vivíamos naqueles tempos e, mesmo assim, saíamos com capricho. 
Os componentes eram pessoas simples, integradas aos batutas da cidade, que curtiam essa forma gostosa de sentir-se responsável pela alegria dos moradores e turistas.
Ubatuba realmente é singular.
Deve ser uma das poucas cidades em que certos setores precisam voltar no tempo para evoluir.
Fiquei satisfeito em saber que neste carnaval teremos blocos animando a avenida.
Eles representam uma forte tradição da cultura caiçara.
Precisam e merecem apoio.
Darão brilho à festa.
Mas, e as nossas escolas de samba?
Além do Itaguá, Brasília e Acadêmicos, poderíamos contar com o Perequê-Açu, a Estufa e o Ipiranguinha. 
Acredito que, para 2001, cada uma delas conseguiria mobilizar umas 500 pessoas.
Seriam aproximadamente 3000 componentes na avenida, fora os blocos.
Uma bateria razoável precisaria de uns 80 instrumentos.
Novos, devem custar uns seis mil reais.
Para seis agremiações chegaríamos à R$ 36 mil.
Cada escola deveria ter a sua área para ensaios.
O setor de patrimônio municipal poderia indicar algum terreno público, sem uso, no bairro da escola, porém afastado de residências, não gerando conflitos.
Em seguida, a prefeitura pediria aos vereadores avaliar autorizar a cessão destas áreas às respectivas agremiações. 
Solicitaria ainda que o departamento jurídico da câmara, somado à procuradoria municipal, orientassem aos presidentes das escolas quanto a regularização da papelada: 
Relação e aprovação da diretoria; livros de registros; atas; carimbos e selos cartoriais, enfim, aquelas chatices que nossas leis consideram fundamentais, mesmo que o que esteja escrito não seja lido.
Para completar, só precisaríamos ter um prefeito e um telefone.
Basicamente ele faria duas ligações.
Primeira - Ao presidente da Associação Comercial:
"Jija, bom dia! Preciso de duas gentilezas. Relacione empresários que possam se cotizar para bancar os instrumentos de nossas escolas de samba. O cálculo inicial é de 36 mil reais. Tenho a lista do material. Peço ainda que contate cada diretoria. Estou com os nomes e endereços. Tente descobrir se sobrou instrumental dos bons tempos. Uma boa reforma, somada à sua habilidade de comerciante, deverá fazer esse valor cair bastante. Aceita o desafio?"
Segunda - Ao gerente do Banco do Brasil:
"Castro, boa tarde! Como vai? Preciso dos seus préstimos. Nosso departamento jurídico, somado ao da câmara, auxiliou na regularização dos documentos de todas as escolas de samba do município. Todos os diretores não têm restrição bancária e, alguns deles, são empresários bem sucedidos. Também já cedemos terrenos para a construção de quadras. Sabe como é, Ubatuba tem muita chuva. Nossa ideia é que estes locais sirvam como ponto de encontro permanente de jovens e adultos que poderão à noite, após o trabalho e o estudo, realizarem grandes ensaios. E durante o dia o espaço ainda poderá ser usado para atividades comunitárias. Para tanto, solicito o seguinte. As escolas de samba precisam de uma linha especial de crédito para construir seus galpões. Mil metros quadrados de área coberta, por escola, é o suficiente para o momento. Eles precisam de bom prazo, juros mínimos e, se possível, uma carência de um ano para iniciar o pagamento. Ubatuba poderá contar com o Banco do Brasil?"
Agora, eu é que pergunto:
Dá para adivinhar as respostas?
E mais:
Carnavalescos eu sei que temos.
Eles criam formas para conseguir patrocínio para as fantasias.
Povo animado, também temos.
Telefone funcionando, certamente.
Prefeito?
Se tivermos e ele agir agora, o carnaval de 2001 será "só alegria".
Se nada acontecer, vou preferir acreditar que o Andrade não seja ruim da cabeça.
Afinal, quem não gosta de samba...

Samba da Minha Terra
Dorival Caymmi
Novos Baianos